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Entretanto, não obstante sua preocupação obsedante pelos negócios militares, ou talvez em virtude mesmo dela, D. Luiz António deu amplo comprimento às ordens régias relativas a criação de povoados e vilas. Destas, nada menos que oito foram erigidas durante o seu governo: São José dos Campos, Atibaia, Faxina, Mogi-Mirim, Apiaí, Itapetininga, Lages (hoje pertencente à Santa Catarina) e Guaratuba (hoje pertencente ao Paraná). O propósito que por muito
tempo animou o capitão-general foi o de criar povoações nas margens do Tietê, até a
sua embocadura no Paraná, notadamente nas imediações das corredeiras, Avanhandava e
Itapura em principal, a fim de facilitar o transporte às expedições que conduziam
víveres e munições e de formar portos de reabastecimento para as tropas de Iguatemi e
de outras colônias militares da fronteira. Convencido da privilegiada posição
estratégica de Iguatemi, entendia D. Luiz Antonio que eram "notórias as utilidades
de que podem resultar a estas conquistas da segurança daquele passo, que depende de se
povoar o Rio Tietê e se fazer permanente um estabelecimento naquelas partes em que nos
fortifiquemos" (Docs. Ints., XXIII, 299). Nesse empenho, remeteu
Antonio Correa Barbosa para a barra do rio Piracicaba no Tiete, a fim de plantar ali uma
povoação. Escrevia o capitão-general, em 24 de dezembro de 1766, ao conde de Oyeiras : Desejando dar
providência sobre a falta que há de Povoações civis nesta Capitania, tenho disposto
mandar; formar seis em diferentes partes que me pareceram as mais próprias, e as
mais úteis pela sua situação, comodidade fertilidade do país e são as
seguintes: l.a - Uma na barra que faz o rio Piracicaba entrando no rio Tiete, dez léguas mais adiante de Araraitaguaba, última povoação em que se embarca para o Cuiabá, para que os que fazem esta viagem tenham escala mais abaixo, em que possam refazer-se; escolhi para Diretor dela a António Correa Barbosa ... (01) Foram invencíveis, porém, as dificuldades que encontrou para a realização de seu intento. O capitão-general determinava mesmo que se passasse "um bando por toda a Capitania para que todos os que quiserem tirar sesmarias nas bordas do Tiete; para se lhe darem" (02). Mas ninguém acedia aos convites para ir povoar aquelas paragens, alegando que tais lugares eram pestilentos e avaro o seu solo. Não obstante, ainda em 1768, teimava D. Luiz António: "Em quanto ao passo da Avanhandava, me tenho informado que o lugar pestilento e doentio é só onde faz inundação, porem que tem campos saudáveis, e aprazíveis, em que se pode formar a Povoação, ou mais acima, ou mais abaixo há-de haver sitio acomodado para a dita Povoação" (03). Por outro lado, Iguatemi a
irradiar a sua triste fama por toda a Capitania e as ameaças constantes de incursões de
tropas espanholas em território pátrio, constituíam forte motivo para que, apesar de
suas largas promessas, ninguém atendesse aos desejos do governador. Assim a facilidade promovida
pelo capitão-general no tocante à concessão de sesmarias marginais ao Tiete abaixo não
era aproveitada pelos caboclos, que preferiam ficar com suas famílias nos povoados mais
adiantados ou atirar-se aos sertões pouco explorados do oeste e nordeste. Essas dificuldades foram de
tal monta, que não só alteraram a localização de Piracicaba, como demoveram D. Luiz
António dos seus propósitos, pois em boa hora resolveu ele incrementar as povoações
nascentes e erigir em vila as freguesias mais importantes, no que prestou inestimável
beneficio a Capitania. Por motivos diversos,
António Correa Barbosa não se estabeleceu nas imediações da foz do Piracicaba no
Tiete, indo localizar-se setenta quilômetros rio-acima, na margem direita do caudaloso
afluente do Tiete, nas proximidades do seu marulhoso salto, para onde foi atraído pelo
"seu terreno alegre, fértil, cheio de salsaparrilha, excelente para todo o gênero
de cultura" e onde já se achavam estabelecidos, com ranchos e roçados, hortas e
pomares, numerosos pescadores e sertanejos. Por provisão de 24 de julho
de 1766 era António Corrêa Barbosa nomeado para o cargo de Diretor e Povoador de
Piracicaba, com ordem expressa de tratar os moradores antigos e os que se estabelecessem
de novo com toda a suavidade e sem vexação , recomendação grandemente
necessária para o primeiro regente «daqueles povos" - como se vai provar a
saciedade no decurso desta história. Logo depois de nomeado o
capitão povoador, D. Luiz António expediu um Bando relativo à fundação do novo
núcleo, proclamação essa de 17 de novembro de 1766 - "para se formar uma
Povoação na Paragem chamada - Piracicaba - de que é diretor, e Fundador António
Corrêa Barbosa". Do I. LXV 112. Dando cumprimento as ordens recebidas, António Correa Barbosa fundava oficialmente, a 1° de agosto de 1767, a povoação de Piracicaba, para onde fora "com administrados (25) vadios, dispersos, e vagabundos". O próprio governador da Capitania entregava-se ardorosamente ao mister de congregar gente para esse fim e, movimentando capitães-mores, ajudantes, auxiliares das vilas e povoações, cobrindo as despesas com saques ao Provedor da Fazenda Real, ia remetendo presos vagabundos para engrossar a nova povoação, recomendando a Correa Barbosa os arranchasse e governasse com aquela suavidade exigida para o bem dos povos. Exemplos desse afã do
Morgado de Mateus são as ordens e portarias que reproduzimos a seguir, todas referentes
aos primeiros anos da vida piracicabana, apos a fundação oficial da povoação: Porquanto se faz
preciso passar vários moradores ~a freguesia de Araritaguaba para a nova Povoa~ao de
Piracicaba, aos quais, por serem pobres, se faz deficultoso pagarem fretes de canoa, e
muito mais comprarem-na nova: o Provedor da Fazenda Real mandara assistir com o
necessário para se consertar uma que na mesma paragem ha incapaz de se nave~ar nela, para
efeito de por este suave meio se conseguir um tão proveitoso fim, que S. Majestade tanto
recomenda nas Suas Reais Ordens. S. Paulo a 3 de Julho de 1767. (Docs.
Ints., LXV, 155). Porquanto se faz
preciso formar uma Povoação na paragem chamada - Piracicaba - termo da Vila de Itu, e se
necessita saber se a terra onde ela se erige esta possuída por alguma pessoa que da mesma
tenha títulos: Ordeno a toda, e qualquer pessoa que tiver títulos das ditas terras,
assim de Escrituras de Compras, de Sesmarias, ou outros quaisquer, os venham apresentar na
Secretaria deste Governo no prefixo termo de quinze dias, contados do dia da publicação
deste em diante: e acontecendo não haver ainda das referidas terras títulos alguns; mas
sim, haver alguma pessoa que tenha feito requerimento para se lhe concederem por Sesmaria,
apresente esse mesmo requerimento no dito termo, e os mais papeis / se os houverem / que
tiver a esse respeito. S. Paulo a 4 de junho de 1767 (Docs. Ints., LXV, 156). O Capitão-mor Salvador
Jorge Velho, assistirá ao Povoador de Piracicaba com algumas coisas precisas para a
subsistência da gente que ali vai povoar, e todo o gasto com que lhe assistir, lhe
pagará o mesmo povoador das Canoas, e frutos que colherem os mesmos moradores da
Piracicaba, e também dos mesmos que a ele pertencerem. S. Paulo a 18 de setembro de
1767. (Docs.
Ints., LXV, 181). O Provedor da Fazenda
Real mande pagar ao Sacerdote que for desobrigar os moradores da Nova Povoação de
Piracicaba, a importância que ajustar com o mesmo Sacerdote o Povoador da dita
Povoação. S. Paulo a 23 de junho de 1768. Com a rubrica de S. Exa. (Docs.
Ints., XV, 208). Todos os moradores, que
se acham situados desde.a Boa Vista até a Povoação de Piracicaba, o Capitão João
Fernandes da Costa os não embarace, e os deixe à ordem do Povoador Antonio Correa
Barbosa, para os administrar conforme entender é mais útil à mesma Povoação. S. Paulo
a 11 de agosto de 1769. Com a rubrica de S. Exa. (Docs.
Ints., LXV, 282). _______________________________ (01)
- Docs. Ints., XXIII, 40 (02)
- Docs. Ints., V, 78. (03) - Id. ib. (25) Por carta régia de 19
de fevereiro de 1696 os moradores de São Paulo foram autorizados a administrar sob certas
condições os índios livres descidos do sertão. Era uma modalidade de escravidão do
gentio, sendo esses escravos designados pelo termo ADMINTRADOS. Copyright © 2002 by Benedito Miguel Gil |